
A ROLETA DOS SWAPS

A ROLETA
DOS SWAPS
Estes contratos podem custar-nos - a todos nós, contribuintes - mais 3 mil milhões de euros. Mas afinal, o que são, como foram feitos e como podemos contorná-los? As respostas a seguir
POR PAULO M. SANTOS
O caso dos swap, que envolve especulação com dinheiros públicos, pode acarretar, para os contribuintes, uma fatura superior a 3 mil milhões de euros.
Os contratos estão a ser renegociados com a banca, mas muitos deles poderão acabar na barra dos tribunais, assim como os gestores que os assinaram.
Em 25 perguntas e respostas tentamos esclarecer tudo o que há, até agora, para saber sobre o escândalo que está a assolar o País e que poderá ficar mais caro aos contribuintes que o BPN.
1 O que são contratos de swap?
São contratos que permitem gerir o risco de um empréstimo sujeito às variações das taxas de juro. Grosso modo, os bancos oferecem aos clientes devedores o direito de estabelecerem uma taxa fixa sobre a dívida. Este processo assegura que, se as taxas de juro continuarem a subir, o custo associado ao empréstimo não atinge níveis insuportáveis. Funciona quase como um seguro sobre o empréstimo. No entanto, se as taxas baixarem o encargo fica do lado de quem deve.
2 E porque é que as empresas públicas recorreram a este tipo de contratos?
O primeiro objetivo foi garantir que os encargos da dívida não disparavam com o aumento das taxas de juro. Antes da crise, em 2008, a Euribor estava a subir à média de quase um ponto percentual por ano. Passou de pouco mais de 2%, em 2005, para quase 5%, em 2008. Como as empresas públicas, sobretudo as de transportes, têm um forte endividamento bancário, esta foi a for-• ma de tentarem aliviar o serviço de dívida que crescia, de ano para ano.
3 Então o que correu mal?
O Segundo a investigação do Governo, algumas das empresas fizeram contratos de swap «altamente especulativos», que criaram mais dívida do que se esperaria de um normal contrato de gestão de risco de crédito.
4 Como?
Acordaram cláusulas para os contratos associadas à flutuação de matérias-primas, como o petróleo, ou mesmo à desvalorização cambial. Além disso, há situações em que os prazos dos swaps se estendem para além do reembolso das dívidas a que os contratos estão associados. Alguns serviram, portanto, para aumentar a dívida e, pela forma como se encontram elaborados, podem ser altamente lesivos do erário público.
5 Os contratos são todos iguais?
Não. Cada caso é um caso. Depende das negociações com abanca e dos parâmetros negociados. Além disso, existem contratos de swap para cobertura de risco, mas também para diversificação ou reestruturação da dívida. É nestes últimos que reside o grande problema agora detetado.
6 Quando foram assinados estes contratos «especulativos»?
As datas são variadas mas, na grande maioria, foram assinados ao longo da última década. No entanto, os mais especulativos foram, segundo o Governo, celebrados entre 2008 e 2010.
7 E ninguém detetou os problemas associados?
Parcialmente. O Tribunal de Contas alertou os responsáveis e fez recomendações sobre os swap contratados, em 2003. Em 2008, foi efetuada uma auditoria ao setor empresarial do Estado que detetou vários problemas nestes contratos. Foi proposta uma «análise aprofundada» ao passivo remunerado das empresas públicas. O secretário de Estado do Tesouro da época, Carlos Costa Pina, obrigou as empresas públicas a prestar informação detalhada sobre a contratação de instrumentos de gestão de risco financeiro.
Alerta O Tribunal de Contas já tinha feito recomendações sobre os swap, em 2003
EXISTEM CONTRATOS «SWAP» PARA COBERTURA DE RISCO, MAS TAMBÉM PARA DIVERSIFICAÇÃO OU REESTRUTURAÇÃO DA DÍVIDA.
É NESTES ÚLTIMOS QUE RESIDE O GRANDE PROBLEMA
8 Quanto é que estes contratos já custaram O ao Estado?
As perdas potenciais ascendem a 2 631 milhões de euros
9 Mas fala-se já de mais de 3 mil milhões de euros...
Sim, porque os 2 631 milhões de euros foram apurados em setembro de 2012, altura em que foi elaborado o último relatório. Com a contínua descida das taxas de juro, as autoridades estimam que o valor possa já ter ultrapassado a barreira dos 3 mil milhões. No entanto, este valor só será real quando estiver concluído o próximo relatório sobre o setor empresarial do Estado.
10 Como é que estes custos atingiram valores tão elevados?
Porque os indexantes dos empréstimos baixaram bastante, em poucos anos. A Euribor a seis meses, por exemplo, uma das mais usadas neste tipo de contratos, baixou de quase 5%, em 2008, para 0,3%, este ano.
11 o que significa a expressão «perdas potenciais»? Não estamos mesmo a perder dinheiro?
São perdas que podem não acontecer. Ou seja, o dinheiro ainda não está perdido, pois as taxas de juro podem subir nos próximos anos (embora esto cenário seja altamente improvável, tendo em conta a debilidade da economia europeia) . Este valor só representará uma perda efetiva se existir à data de reembolso do dinheiro dos empréstimo. Até lá, é contabilizado como perda potencial.
12 Quanto é que a Euribor necessita de subir para que o Estado não perca o dinheiro?
É difícil responder, mas segundo as contas do Instituto de Gestão do Crédito Público, bastaria que a Euribor subisse um ponto percentual para que as perdas potenciais descessem quase mil milhões de euros.
13 E as taxas deverão descer?
Essa é a pergunta a que ninguém conseguirá responder. Mas se se mantiver este clima recessivo na União Europeia, o mais certo é que o Banco Central Europeu mantenha as taxas em baixo, para estimular o crescimento económico.
14 O dinheiro só pode ser recuperado dessa forma?
No caso dos contratos normais de cobertura de dívida, sim. Nos outros, os apelidados de «especulativos», o Governo está a negociar, há cerca de dois meses, diretamente com os bancos credores, para tentar baixar os custos da dívida.
15 E qual o resultado?
Segundo o Governo, já os encargos já diminuíram 170 milhões de euros. E apenas dois bancos não quiserem renegociar os contratos: o JP Morgan e o Santander.
16 Todas as empresas que contrataram swaps estão a perder dinheiro?
Não. Das 15 empresas públicas que têm contratos swap, duas estavam com saldo positivo, no final do terceiro trimestre do ano passado, a última data da atualização.
17 Quais foram os bancos que fizeram estes contratos?
Segundo as informações já disponibilizadas, a grande maioria dos contratos altamente especulativos foi celebrada com bancos estrangeiros, como a Goldman Sachs, JP Morgan, Santander, BNP Paribas, Deutsche Bank, Barclays, Crédit Suisse e Nomura.
18 E quais as empresas públicas envolvidas?
De acordo com o Governo, as que fizeram contratos altamente especulativos são o Metro de Lisboa, o Metro do Porto, Carris, STCP, Egrep e Águas de Portugal
Trasportes Segundo o Governo, as empresas públicas de transportes - Carris, Metro de Lisboa, Metro do Porto a STCP estão entre as que realizaram contratos altamente especulativos
A GRANDE MAIORIA DOS CONTRATOS ALTAMENTE ESPECULATIVOS FOI CELEBRADA COM BANCOS ESTRANGEIROS
19 Este é um caso que ocorreu apenas com empresas públicas?
Não. Ainda recentemente, três empresas privadas interpuseram uma ação judicial contra os bancos com os quais firmaram contratos deste tipo.
20 qual foi o resultado?
Os bancos perderam o processo.
21 E como conseguiram essas empresas sair vencedoras?
A principal razão invocada pela defesa foi que era manifesta a incapacidade dos gestores de perceberem o que estavam a assinar.
22 Então porque não usa o Estado o mesmo argumento?
É mais difícil, porque as empresas do setor empresarial do Estado devem, suposta-mente, ter gestores capazes de «entender» matérias com este grau de complexidade e sofisticação. Teremos de esperar que os processos sejam levados a tribunal no caso de as negociações não chegarem a bom termo entre as partes) para perceber o sentido das decisões judiciais.
23 Este é um caso que apenas ocorreu em Portugal?
Não. Existem em vários países, um pouco por todo o mundo. Nos EUA, corre os seus termos um dos casos mais emblemáticos deste tipo de contratos. A comunidade de Jefferson pediu aos banco 250 milhões de dólares para instalar um novo sistema de esgotos. Mas, após ter recorrido a uma série de contratos de swap para, supostamente, baixar o custo do empréstimo, acabou por ficar com uma dívida bancária de 3 mil milhões de dólares, acabando na falência.
24 Há responsabilidade criminal dos gestores que assinaram os contratos?
Essa ainda é a grande dúvida. Sabe-se que, nos EUA, por exemplo, foi provada a existência de subornos de gestores bancários a gestores públicos, para que alguns contratos de swap especulativos fossem assinados. Em Portugal, ainda não conhecemos todo o processo de negociação, nem os pormenores de todos estes contratos. As primeiras consequências registaram-se a nível político. Dois secretários de Estado, Juvenal Silva Peneda e Paulo Braga Lino, foram demitidos dos cargos. Ambos eram quadros do Metro do Porto, na altura em que os contratos foram assinados. Além disso, o Governo jáadmitiu processar todos os gestores públicos envolvidos.