
JYRKI KATAINEN E O PEQUENO PORMENOR DA DESVALORIZAÇÃO CAMBIAL
O primeiro-ministro finlandês esteve ontem na Universidade Nova, confiante que Portugal vai conseguir repetir o "milagre" finlandês da década de 90. Mas houve um "elefante" que esteve sempre presente no auditório: a desvalorização de moeda que Lisboa não pode fazer
NUNO AGUIAR
naguiar@negocios.pt
"Quando encontro portugueses estão sempre mais pessimistas do que eu em relação ao futuro de Portugal", confessou o primeiro-ministro finlandês.
O tom de optimismo que Jyrki Katainen trouxe quinta-feira para o auditório da Universidade Nova de Lisboa teve dificuldades em fazer eco numa sala ocupada pelo "elefante" da desvalorização cambial.
O governante escandinavo explicou a alunos e professores como é que a Finlândia saiu da grave crise económica que enfrentou nos anos 90.
"A Finlândia estava numa situação semelhante a Portugal, com o PIB a cair 10% e o desemprego perto dos 20%", recordou, durante uma conferência moderada pelo ex-ministro das Finanças, Jorge Braga de Macedo.
"Eu e os meus colegas de faculdade queríamos ficar o máximo de tempo possível na universidade, porque achávamos que nunca iríamos ter um emprego."
A receita aplicada passou por alguma austeridade, liberalização do mercado laborai e de produto, mas também por investimento em investigação e desenvolvimento, bem como reduções de impostos para empresas.
Katainen traça paralelos com Portugal. "Estivemos alguns anos em recessão e todos começaram a questionar se tínhamos feito o mais correcto.
Havia coisas positivas, como as contas externas, mas o cidadão comum não viu grandes alterações", afirmou, acrescentando em relação a Portugal que "não conseguimos ainda ver muita criação de emprego, mas temos de acreditar no futuro.
Tenho a certeza que vai resultar".
A - agora na moda - "narrativa" foi recebida com algum cepticismo por parte da audiência, constituída por professores, alunos e representantes de empresas.
Um aluno quis saber se o facto de a Finlândia ter, na altura, moeda própria e Portugal estar no euro não faz toda a diferença. Enquanto um professor deixou uma provocação: "durante a crise de 90, o Banco Central da Finlândia portou-se mais como a Fed [Reserva Federal norte-americana] ou como o BCE?"
"A situação é completamente diferente.
Portugal não pode desvalorizar a moeda, o que torna a situação mais desafiante", reconheceu o primeiro-ministro finlandês, embora tenha acrescentado que "a desvalorização [cambial] não funciona para sempre".
"Serve para o motor arrancar, mas não é uma receita sustentável."
Para contornar a impossibilidade de desvalorizar moeda, Katainen referiu que alguns países que optaram por realizar fortes desvalorizações internas, citando o exemplo da Letónia.
Um país que teve de enfrentar uma queda de 18% do PIB em 2009, viu a sua taxa de desemprego saltar de 8% para 18% no mesmo ano e que, desde 2007, perdeu 9% da população entre os 15 e os 64 anos.
"Quem emprestaria dinheiro a Portugal? Ninguém"
Quando questionado sobre a dose de austeridade aplicada a Portugal, o primeiro-ministro defendeu a estratégia.
"Quem emprestaria dnheiro a Portugal se Portugal não tivesse assumido as suas responsabilidades?
Acho que ninguém."
Katainen defende mais integração europeia, mas apenas até certo ponto.
Comércio, mercado único e segurança? Sim.
Transferências entre países? Aparentemente, não.
"Todos somos responsáveis pela nossa economia.
Não podemos fazer outsourcing para a União Europeia da responsabilidade da política orçamental", sublinhou.
Quando encontro portugueses estão sempre mais pessimistas do que eu em relação ao futuro de Portugal.
Portugal não pode desvalorizar a sua moeda o que torna a situação mais desafiante.
JYRKI KATAINEN
Primeiro-ministro finlandês